A surra foi grande. O tsunami de Yokohama ainda permanecerá
marcado por muito tempo – quiçá com hematomas indeléveis - na mente alvinegra
depois deste 18 de dezembro. Nós, santos da bola, que um dia ensinamos ao mundo
a magia do jogo, provamos hoje do nosso próprio veneno, como magistralmente afirmou
o técnico Guardiola, na coletiva de imprensa: "O que tentamos fazer é
tocar a bola o mais rápido possível. Na verdade, é o que o Brasil sempre fez,
segundo me contavam meus pais e meus avós".
Meus guris, como diria Chico, vocês descendem destes
inventores!
Não das “cantoneras”, espaços de incubação dos garotos
catalães. Lá, são doutrinados pela filosofia cruyffiana da solidariedade mútua,
de contribuição e ocupação de espaços visando plenitudes defensiva e ofensiva. O
improviso é igualitário; a imaginação, idem. O passe, o drible, o chute, tudo é
milimetricamente calculado, apurado. Não há erros ou sobras. O “lúdico” é se
divertir e não deixar o outro participar.
Nada mais fabril. Nada mais perfeito.
Nada mais chato.
Levamos um pito da bola. “Por que me abandonaste?”, deve ter
sussurrado consigo própria, governada de pé em pé por habilidosos e ligeiros espanhóis,
enquanto desfilava por impassíveis alvinegros. Ficamos atônitos diante da
plasticidade azul-grená, da movimentação incessante do precursor carrossel
laranja, enfim, de uma miscelânea de cores e tons como as telas desconcertantes
do também catalão Miró.
Mas, “o sol há de brilhar mais uma vez...”, não é, mestre
Nelson? A dor passa, meus meninos, e ensina. Diante da soberania adversária,
bem distante da carnificina do escrete canarinho diante da Holanda de Cruyff,
em 74, os santistas aplaudiram Messi e cia., enxugaram as lágrimas e prometeram
voltar.
O sol há de brilhar mais uma vez... E não é assim a vida de
cada um de nós?
Estes gringos nos plagiaram em quase tudo. Aperfeiçoaram os
ensinamentos do futebol com educação e cultura europeias. Educação e cultura,
pois é. Este talvez fosse nosso maior ensinamento. Pelo menos isso, garotos da
Baixada, não é culpa de vocês.
E por mais que tentem nos imitar, jamais serão como nós.
Porque somos inconstantes, imperfeitos, tempestuosos. Não como a existência
humana deveria ser, mas como ela é. Conquistamos neste ano a terra descoberta
por Colombo em gramados esburacados de San Cristóbal, Santiago, Assunção,
Querétaro e Manizales.
Somos a magia e o suor envolvidos em pano branco.
Se eles são deuses, como afirmam, somos santos.
E santos são feitos de carne e osso.